sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Galinhas me mordam


Chegando à entrada do condomínio onde moro, me deparei com dois homens de uniforme laranja, botas pretas, vassouras, uma pá, um carrinho de mão e alguns cones. Eram os famosos cenourinhas, garis, varredores. Você escolhe o nome.

O que me chamou atenção foi o fato deles estarem fumando tranquilamente a sombra do muro. Acenei com a cabeça em cumprimento e eles me retribuíram com o mesmo gesto.

Uma hora mais tarde, indo a padaria, alguns metros da portaria avistei a dupla sentada como se tivessem nada pra fazer.

Pra mim foi o fim da picada. Se eles acenassem pra mim outra vez eu mandariam tomar no repolho (ué, mudou de nome?).

Na padaria pedi quatro pães.

Um e sessenta, disse a balconista coçando o sovaco.

Galinhas me mordam, por que elas já devem ter dentes. Quarenta centavos um pão?

Não.

Não.

Vou passar no zoo no final de semana, pra ver a banana comer o macaco.

Mas me ocorreu como por epifania: estava me torturando por pouca coisa.

Sim.

Sim.

Pouca coisa.

Era pra ser entregue em 2012 a obra da transposição do Rio São Francisco iniciada em 2007. Um empreendimento orçado em R$ 8.000.000.000,00 (oito bilhões de reais) para levar água aos 12 milhões de nordestino. Que segundo dados do Ministério da Integração (existe sim, um ministro da integração e muitos outros que ainda não sabemos) foram concluídos apenas 43% das obras em cinco anos. CINCO ANOS. Quem passa por lá deslumbra o verdadeiro descaso de um canteiro de obras bilionário completamente abandonado. E devido à falta de manutenção dos trechos concluídos, devem ser refeitos novamente. Do zero. Do nada.

Deixe-me ser mais claro:

A Mega-Sena da Virada de 2012 para 2013 sorteou o maior premio das loterias brasileiras, um valor histórico de R$ 230.000.000,00 (duzentos e trinta milhões de reais) com esse premio, o contemplado, poderia comprar uma frota de 9.200 carros populares de R$ 25.000,00 cada, 1.533 casas no valor de R$ 150.000,00 cada, 09 jatos executivos, ou se aplicasse na poupança renderia um valor de R$ 1.150.000,00 (1,15 milhões de reis POR MÊS).

Agora imagine se o premio fosse R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões)

E se dobrarmos esse valor teremos apenas 01 bilhão. Precisamos multiplicar por oito para chegar ao valor da Transposição do Rio São Francisco.

Você entendeu o rombo que ficou nos cofres públicos para nossos irmãos continuarem com sede?

E o curta-metragem que virou “longa-quilometragem” da Rodovia BR-230, a Transamazônica inaugurada em 27 de agosto de 1972 pelo presidente Emílio Garrastaza Médici (sim, tivemos esse presidente). Objetivo: ligar nada a coisa nenhuma.

Bom, deveria ser importante, porque gastar R$ 2.500.000.000,00 (dois bilhões e meio de reais) em terraplanagem e asfalto.

Muitos nordestinos foram em busca da riqueza prometida em campanha política da presidência, (governadores e outros políticos que usavam o pretexto para receber votos) deixando sua história e seu povo para trás.

E como o Brasil estava engatinhando para a Era do Saneamento, muitos ali morreram de cólera e malária. Hoje o grande empreendimento da terceira maior rodovia do país é uma cicatriz no imenso vazio demográfico que completou 40 anos em 2012. Claro que formada por buracos e lama.

Se jogaram tanto dinheiro pelo ralo e tudo se assemelhou normal.

E pareceu justo.

E pareceu eficaz.

Dois funcionários da prefeitura não incomodaria ninguém. (Exceto a mim).

Contei as moedas e paguei os pães.

Eu realmente estava embravecido. Mas tinha me esquecido que estou no Brasil. Onde se paga tanto e não se tem nada.

E para ver esse povo feliz, não precisa de infraestrutura, nem saúde, transporte, segurança, educação ou lazer.

Basta não faltar futebol e carnaval. Mantendo esses dois entretenimentos está garantido a reeleição da nossa presidenta.

Na volta passei pelos garis e acenei com a cabeça:

Boa tarde!

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